Fazia 12 graus em São Paulo e – sim! – isso significava que eu vestia, pelo menos, umas quatro ou cinto camadas de roupa diferentes. Todo ano, assim que o verão acaba, eu fico seriamente angustiada. Minha dúvida é sempre a mesma: como diabos vou sobreviver a esse outono e, pior, a esse inverno tenso? Sempre achei frio um negócio insuportável. Nunca gostei de vento, de chuva e muito menos de casacos. Como diria uma amiga: “eu tenho vontade de raspar minhas tetas no asfalto” toda vez que alguém fala, feliz da vida, que adora “dormir com chuvinha”, “usar cachecol e luvas” e “tomar um cafézinho num dia de ventania”. É provavelmente por esse motivo que vocês só vão ver fotos de praias bonitas e trilhas estonteantes nas minhas redes sociais. Eu não suporto a ideia de gastar dinheiro indo para qualquer destino em que faça menos de 10 graus mais de uma vez por mês – ainda mais em tempos de dólar a 4 contos e euro a quase 6.
“Quem é que paga 4 reais num dólar pra ver cinza?”, eu me pergunto, toda vez que vejo alguém saindo daqui pra “curtir” uma Nova York ou Berlin da vida durante o inverno.
Não demorou muito tempo andando na rua para eu me convencer que as minhas quatro ou cinco camadas de roupas já não eram mais suficientes. E lá fui eu, para o shopping perto de casa, para finalmente mandar o frio de São Paulo “para aquele” lugar. Eu havia decidido que desta vez seria diferente. Eu decidi que, desta vez, ao invés de passar os próximos meses emburrada com o frio e com o vento, eu os enfrentaria de frente, com um casaco de pelo novinho, quentinho, com touca e bolsos fundos. Um casaco que, para ser perfeito mesmo, só não deveria ser um casaco e sim um shortinho e uma regatinha.
Encontrei meu casaco “dos sonhos” na Zara e, apesar do valor alto dessas coisas, deixei a mão-de-vaquice de lado. Passei no caixa, peguei minha sacola e decidi que a compra do ano deveria ser comemorada com uma gordice a altura, uma gordice tipo um Big Mac do Mc Donald’s, porque, afinal, como eu disse neste post sobre meu 1 mês na academia, eu não nasci para frango e saladinha. Nasci para hambúrger, batata frita e milkshake.
Sentei nos sofás do fundo do refeitório para pensar em como os meus dias estavam caóticos. Eu sempre acreditei em energias boas e ruins, mas mais ainda, acreditei sempre também que coisa ruim “só passa” se você deixar. Eu fui sempre uma goleira digna de Bola de Ouro da FIFA, mas ultimamente, até a vida de Gilberto Braga pós-beijo gay em “Babilônia” (por favor, me desculpem pelas referências pop exageradas) deveria estar mais tranquila do que a minha. Dei a primeira mordida na minha batata frita tentando arranjar uma saída para os dias tristes, mas mal consegui focar na questão. Ouvi, imediatamente, uma voz mais alta vindo da mesa ao lado. Como uma boa história sempre me interessa, abri os ouvidos:
– “Por favor! Não conta da sua vida pessoal para elas. Isso e fofoquinha besta. Elas não precisam saber da sua vida sexual. Não precisam saber que você foi no motel. Não precisam ver a sua foto no espelho do motel!“, disse, alto, a mãe de uma adolescente de, no máximo, seus 18 anos.
O nome da menina que levava um sermão na mesa ao lado era Camila. Ela tinha a pele morena, os olhos amendoados e o cabelo encaracolado. A maneira como sentava, cravando as unhas na bolsa pequena vermelha, dizia muito sobre o incômodo que sentia ali, de frente para a mãe e o pai. O casal a sua frente repetia o tempo todo que não importava que os dois eram separados, mas que eles sempre seriam seus melhores amigos, em quem ela poderia e deveria sempre confiar.
A cada nova batata frita e a cada nova frase dos pais, eu entendia melhor o que causara toda a confusão. A briga era culpa de duas meninas, a Milena e a Thais, primas de Camila. Aparentemente, elas receberam fotos da adolescente em poses e lugares comprometedoras e mostraram para uma boa parte da família.
– “Camila do céu! E se elas tivesse postado isso para alguém?”, perguntou o pai, um homem negro simpático que vestia camisa polo branca e azul e óculos na testa.
– “Eu quebro a cara delas se elas postarem”, esbravejou Camila, sem conseguir imaginar no que sua vida se transformaria caso o vazamento das imagens fosse algo real.
Os pais, modernos e (quase) compreensivos explicaram como a vida de Camila poderia ser afetada negativamente se os “nudes” dela caíssem na web. Disseram que o que cai na internet nunca é esquecido, que os empregadores buscam pela vida pessoal dos profissionais na web antes de contratar, que as pessoas da faculdade e do bairro teriam um preconceito com ela…
Apesar da chateação com o acontecimento, que já era comentado entre toda a família, os pais de Camila deixaram claro que a filha poderia tomar suas próprias decisões, mas que precisava sempre pensar nas consequências de tudo.
– “Pode continuar falando com elas (a Milena e a Thaís), só não conta suas coisas pessoais, só não conta seus planos, seus sonhos. O olho é grande, Camila!”, disse o pai.
E a mãe completou, primeiro em tom melancólico e, ao fim da frase, bem humorada:
– “Você é a minha única filha, Camila! Você é a minha única herdeira! Eu vou deixar tudo pra você quando eu enriquecer… E pode ter certeza que eu vou enriquecer. Seja cuidadosa, minha filha. Por favor”.
A conversa dos pais com a Camila acabou na mesma hora em que dei a última mordida no meu sanduíche. Assim que a família foi embora, fiquei pensando em como o conselho de ser cuidadosa da mãe da Camila também me servia, de certa forma. “Cuidado pra não deixar os seus sonhos e os seus planos de lado”, “cuidado para não deixar que o dinheiro dite como sua vida deve ser”, “cuidado para não perder o timing de realizar – ou ao menos tentar realizar – tudo o que você sempre quis”. E o conselho que eu dou para quem também está confuso é esse: cuidado para não perder a coragem de viver a vida que você sempre sonhou.
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Gente, que profundo esse final! Buguei.
Na verdade essa conversa me fez lembrar de algumas coisas e refetir sobre outras. Vamos fazer uma listinha (pq *listinhas* é tão legal!):
1. me lembrei de um pornô caseiro feito por três adolescentes do meu antigo colégio. O vídeo era para ter sido desfrutado apenas entre os três. aí já viu né. um amigo passa para um amigo e outro amigo para outro até a escola toda ter visto. lembro ainda que nessa época o Android nem existia e o vídeo circulou por infravermelho (é isso né? – ou o negócio antes do bluetooth), pois bem, o caso me choca até hoje, não pelo fato da garota ter feito coisinhas com dois rapazes ao mesmo tempo. a parte do caso que mais me choca é a imagem dessa menina ter virado de puta (palavrão pode aqui? – puta não é palavrão, é profissão, correto?) enquanto os meninos para alguns foram garanhões e para outros *os conservadores* deveriam ser perdoados por serem homens, afinal “homi é assim mesmo”. então isso me faz refletir, que por hora os pais dela estão certos, pq sabemos que ela iria ser julgada assim sim.
2. eu não entendi muito bem o lance do sonho, claro que eu concordo com seus conselhos finais e mais ainda na parte do dinheiro, certamente o dinheiro ajuda muito mas as pessoas estão deixando o dinheiro controlar a vida delas, conheço pessoas que dão tanta impotância para isso que esquecem de viver, como se viver estivesse condicionado a ter/gastar dinheiro. enfim…
3.outro ponto que não poderei jamais deixar passar é o de vc escolher estratégicamente o lugar no mc (?) geralmente eu faço isso, gosto de sentar em um lugar onde eu posso observar as pessoas, os movimentos, e ficar ali refletindo entre uma conversa ou outra. te amei por isso <3
4. é uma bosta esse negócio de não contar seus planos ou sonhos para alguém, eu não consigo, por isso tudo fica cagado, ou não. Não acredito muito nesse negócio de alguém ter tanta inveja de "gorar" o plano de uma pessoa. Mas acredito na lei do universo, então basicamente, de repente, a energia ruim do invejo atrapalhe mesmo, só que como tudo o que vai volta…
Amo o blog.
Beijo Beijo.
Allan, amei seu comentário cheio de pontos!
Já vi tanta história machista envolvendo vídeos caseiros que só consigo pensar que esse mundo tá mesmo de ponta cabeça! :/ Que tensa essa história da menina do seu colégio, sério!
Acho que nos próximos posts você vai entender melhor esse negócio de sonhos/dinheiro/etc. Muita coisa rolou daqui pra eu entender que, realmente, a vida é feita de escolhas e que tudo bem você escolher algo diferente do que a multidão dita. Juro que nas próximas pessoas você vai sacar o que rolou e como isso tem me feito uma pessoa melhor! :D
Volte sempre!
Um beijão,
Aline
Obrigado pelo conselho!
“cuidado para não perder a coragem de viver a vida que você sempre sonhou.”
Há anos venho sonhando com um intercâmbio, mas sempre existiu um motivo que impedisse. Dinheiro, depressão, problemas na família, faculdade, e etc.. Até que consegui “resolver” quase tudo e minha hora chegou. Estou terminando a faculdade e está tudo um pouco mais tranquilo por aqui apesar dessa crise e do dólar e o euro estaremum absurdo.
Me planejei por anos por esse momento e agora que chegou, conheci uma pessoa que me fez querer ficar (sendo que desde que me entendo por gente eu quis ir embora, construir minha vida em outro lugar). Há meses venho pensando que não posso desistir do meu sonho de vida por causa de ninguém, ainda mais por alguém que eu nem sei se veio mesmo pra ficar. Me perdoe essa história toda, mas o ponto onde eu quero chegar é o seguinte: Obrigada.
“cuidado para não perder a coragem de viver a vida que você sempre sonhou” bateu forte em mim. Sempre vou lembrar dessa frase quando a ideia de desistir bater nem que seja por um segundo na minha cabeça.
Adoro seu blog :) beijo beijo