Quando a Noemi cambaleou, levemente bêbada, de um lado para o outro da pista de dança, eu não consegui pensar em outra pessoa que não fosse a minha tia Leonor¹. Costumava ver titia assim constantemente: com os olhos distantes, o sorriso largo mesmo quando nem piada havia e com o corpo se movendo com pouca coordenação. Eu sabia que o álcool a destruía aos poucos, mas sempre achei que aquelas bebedeiras a deixavam mais feliz. Por muitas vezes, acreditei que viver no mundo da lua por um tempo não era um grande problema. Só era essencial não se perder por lá.
O que eu senti pela Noemi era exatamente o que eu sempre senti pela minha tia: uma vontade louca de abraçá-la e dizer que tudo bem se ela se comportasse daquela maneira por alguns dias, ou até meses. E foi isso que eu tentei fazer no meio de um karaokê famoso na Rua da Glória, na Liberdade, em Sâo Paulo. Depois de 4 cervejas, eu já estava no ‘ponto’ conselheira (meu jeitinho!). Parei na frente da Noemi, dei um dos meus abraços demorados nela e já ia começar a falar, quando ela saiu na frente:
– “Aaaai! Muito obrigada, querida! Hoje é o meu aniversário!”, disse, com a voz confusa.
Minha reação instantânea foi gritar um ‘yey’ animado, que chamou atenção dos amigos que, numa quinta às 2 da madrugada, ainda estavam comigo no bar. Assim que a Noemi, que deveria ter lá seus 55 anos, me encarou nos olhos sorrindo, não pensei em outra coisa a não ser soltar um agrado:
– “Ouvi dizer que você está fazendo 43 anos! Parabéns, Noeeeemi. Aeee!”, eu comemorei.
A Noemi era baixinha, tinha os cabelos desgrenhados e chamava atenção pelas bolsas enormes debaixo dos olhos. Naquele dia, usava um vestido preto que deixava parte das pernas à mostra e uma sandália que, de longe, parecia bastante confortável… Diferente do meu coturno preto que me impedia de dançar o quanto eu desejava naquela noite.
– “Antes fosse 43, filha!”, disse Noemi. Após uma breve pausa, continuou: “Eu queria cantar Alcione aqui”.
Noemi voltou a sorrir, me convidou para comer comida mineira na casa dela para comemorar o aniversário e foi para a mesa na entrada do karaokê. Estava com o namorado, também já alterado, e o filho, Gustavo, a quem me apresentou. “Ele não é um meninão lindo?”, me perguntou em determinado momento.
Eu voltei a me divertir quando o rapazinho do karaokê chamou pelo nome da Noemi no palco. Naquele momento, a amizade com todos os outros bêbados da pista já rolava solta e eu ajudei a puxar o coro:
– ‘NOEMI! NOEMI! NOEMI!’, gritamos.
A Noemi veio correndo, toda feliz, sendo abraçada por várias pessoas desconhecidas antes de chegar ao pequeno palco. Após uma cantoria intensa de ‘Parabéns Pra Você’, ela começou: ‘Minha estranha loucura é tentar te entender e não ser entendida…’
¹ O nome da tia foi trocado para evitar constrangimentos.
Haaaaaa quero abraçar tia Noemi!!!!!……e muito ler um livro seu!!!! (^.^)//
Que delicia seu blog, hoje terminei de ler todas as histórias e confesso que me emocionei com muitas delas!
Acho tão legal isso, afinal de contas todo mundo no fundo tem algo para contar, a gente só precisa estar mais aberto para ouvir, e você faz isso muito bem.
Beijos, aguardando a próxima história!
hahaha A cara das minhas tias esse jeitinho, na boa. Acabei de conhecer aqui, adorei a proposta do site! :)
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