32. João, o meu amor de verão


Desde que me conheço por gente, crio milhões de teorias que, vistas assim de fora, me fazem parecer um pouco, só um pouquinho louca. Uma delas, que levo para a vida toda, é a de que quando eu lembro até dos detalhes da primeira vez que olhei para uma pessoa é porque ela tem tudo para se tornar especial. E essa teoria tem um complemento: se eu também me lembrar da primeira vez que vi um cara com outros olhos é porque já marcou de alguma forma – nem que seja como um rápido affair, como um amor de verão. Sempre fui totalmente inexperiente nesse negócio de gostar de alguém com muita intensidade. Até antes de ser apresentada ao João, no verão de 2012, só tinha me acontecido isso, de lembrar de tudo, uma vez.

Vi o João pela primeira vez num cruzeiro no comecinho de dezembro. Uma amiga, que costuma ganhar de mim facilmente no quesito ‘fazer amizades rapidamente’, puxou papo com ele no corredor do nosso deck, que por sinal era o mesmo onde ele estava hospedado. A feição do João era de surpresa. O rapaz alto e robusto, que eu jurava ter lá seus 21 anos de idade, parecia não saber responder à toda aquela animação que a minha amiga esbanjava. Acho que pouca gente sabe, aliás. O encontramos pouco nos dois dias seguintes: uma vez no andar superior ao da piscina e outra, no andar do restaurante. Nesta última vez, ele vestia uma camiseta branca, um short preto e tirou os óculos na hora de conversar com a gente. Estava todo vermelho, todo queimado. Certamente era branco demais para estar naquele sol de quase 35ºC. Papo vai, papo vem, convidamos o João para almoçar.. Às 4 da tarde. Ele já havia comido, mas nos fez companhia mesmo assim. Nem se importou com o tempo que levamos entre conversar sem parar e comer tudo o que tinha nos nossos pratos.

Naquela tarde, enquanto o sol se punha, o João, que era bastante tímido, resolveu falar. Graças às minhas intermináveis perguntas, contou tudo sobre a vida dele. Morava no interior de São Paulo, tinha pais separados e buscava realizar um grande sonho: o de entrar num time profissional de basquete e viver do esporte. Não vou esquecer nunca da cara de surpresa que ele fez quando eu contei que já havia assistido um jogo do Lakers com o Boston no Staples Center, em Los Angeles. ‘É sério isso?’, perguntou. Eu respondi que sim, afirmando ainda ter odiado a experiência. Ele parecia não acreditar, mas riu quando eu disse que paguei mais de 80 dólares pra ficar na penúltima fileira do estádio quase sendo empurrada por uns torcedores mais, digamos, fervorosos. O assunto com o João não terminou no basicão que sempre termina com qualquer outro cara. Quando percebemos, já estávamos falando de coisas muito mais profundas: problemas familiares, encanações pessoais… um chororô que eu realmente só costumo ter com gente que me passa confiança.

Acordei na manhã seguinte ao dia das sinceridades com o João certa de que a nossa amizade estava arruinada. Isso porque, naquela nesma noite, bebi um monte de um drink azul chamado ‘vulcão feliz’. Juro que nem percebi que já havia virado uns 14 ou 15 copos daquela porcaria. Lembro de, no caminho de volta do bar, desviar de vários caras bombadinhos sem camisa, parar na frente dele, dançar um sertanejo muito ruim (que obviamente todo o resto da galera amava) e beijá-lo. ‘Você é doida!’, alertou rapidamente a minha consciência, quase me fazendo parar. Mas o João me abraçou e me deu um beijo que eu não dava há muito tempo – aquele que você só dá quando quase explode de tanta química com uma pessoa. ‘Tá, agora chega, Aline’, eu dizia internamente, em vão. Tudo estava lindo até a hora de eu dar ‘tchau’ ao João. Alterada demais, soltei uma frase que prometi nunca mais dizer: ‘Somos só amigos mesmo’. Esse é o tipo de merda que eu já ouvi e passei meses odiando a pessoa que ousou me falar isso. O João foi embora, mas percebi logo cedo que ele não estava bravo. De chinelo havaianas e bermuda branca, ele caminhou até o nosso cantinho preferido no último deck, arrastou uma espreguiçadeira para o meu lado e deitou-se.

Nos dias seguintes, descobri como é fácil se encantar com uma pessoa. Há tempos não prestava tanta atenção em alguém como prestei no João. Já nem me lembrava como era não precisar fazer nenhum esforço pra gostar de alguém, pra estar com alguém. O João nem deve ter percebido, mas a minhas duas coisas favoritas nele eram as mais simples.  Havia momentos em que eu não queria mais nada além de observá-lo. Parava assim, do nada, e prestava atenção no seu jeitão de rapaz crescido. Intimidado, o João sempre perguntava um ‘o que foi?’ preocupado. Também gostava quando ele fala ‘tipo’. O sotaque do interior deixava a palavra ridiculamente fofa naquela voz.

O dia 16 foi o nosso último dia de verão juntos. Ele pegou a estrada para casa e eu subi a serra para a Bela Vista. No mesmo dia, recebi uma mensagem de um cara que estava a fim há séculos em que ele me perguntava se eu queria sair para jantar. Respondi que estava ocupada. Não queria esquecer de como era o beijo e o abraço do João. Queria lembrar de como era ter as mãos dele na minha perna toda vez que nos sentávamos em algum lugar público. Era como se dissesse: ‘Desculpa, caras, mas está aqui já está acompanhada’. A intimidade que surgiu entre o João e eu veio tão rápido que mal percebi que eu e ele fomos só 5 dias.

(Enquanto eu escrevia esse texto, ‘Do You Remember’, do Jack Johnson, entrou no shuffle do meu iPod. Deve significar alguma coisa)

14 thoughts on “32. João, o meu amor de verão

  1. Awn,amei a historia do João.
    E por coincidencia ou não,o nome do meu amor,que ja não é mais meu,também é João. ://

  2. Adorei seu jeito de escrever! E pude visualizar claramente toda a historinha enquanto lia o texto. Seus textos são todos baseados em histórias reais?

  3. Nossa, eu adorei o seu jeito de escrever.. Me senti em um romance daqueles com cruzeiros, pessoas correndo desesperadas e reencontros. kkk Enfim, adorei a ideia do blog também. ;s

    Beijos, beijos

  4. Lindo, envolvente e emocionante!!
    Aline… passei horas ouvindo Do You remember e lembrando de histórias que passei!!
    Suas palavras são demais!

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