52. Sam, o instrutor-tiozão de North Shore


Só nos restava mais dois dias no Havaí e não tinha jeito: todo mundo que cruzava o nosso caminho perguntava se a gente já tinha visitado North Shore. “Sai de Waikiki, só tem turista!”, “vocês já deveriam ter ido”, “se tivessem me conhecido antes, eu levava vocês!” foram só algumas das dicas em forma de bronca que ouvimos. É que North Shore, a costa norte da ilha de Oahu, é famosa por ser:

1) Cenário das principais competições de surfe do Havaí – as ondas em Pipeline, uma das praias de lá, são realmente monstruosas

e

2) Casa do Jack Johnson, um dos personagens mais queridos do Havaí

Como voltar para o Brasil sem conhecer o lugar não estava nos meus planos e nem eu, nem minha amiga sabíamos dirigir (alô, não nos julguem), colamos no balcão de atividades na recepção do hotel e marcamos um tour baratinho pra lá. Transporte ida e volta, um equipamento para praticar nosso esporte favorito e refeição. Pra mim, estava fechado.

– “Vocês precisam esperar o ônibus da tour amanhã, na frente do toldo laranja aqui na entrada do hotel”, disse a atendente simpática que nos chamava de ‘folks’ com a mesma frequência que o Dinho Ouro Preto diz ‘cara’.

No dia seguinte, no horário combinado, lá estávamos nós. O ônibus do Sam chegou 10 minutos depois, cheio de adesivos nas laterais e fazendo um barulho ainda tímido, mas típico de motor desgastado. Depois de perguntar de onde éramos, o instrutor pediu que nos acomodássemos e, animado, começou a falar sem parar. Não passava das 8h30 da manhã e os ingleses, as venezuelanas e os californianos do nosso grupo pareciam não querer ouvir muita coisa no caminho. Toda vez que o Sam abria a boca, era difícil ouvir resposta. Perguntas sem respostas me deixam mal, mas eu também estava acabada. Na noite anterior, curtimos um pub chamado Kelley O’Neil’s até as 4 da manhã (lá conhecemos o Daniel – deixa esse post pra depois!). Eu estava acabada.

O Sam era um tio de uns 40 anos que usava o cabelo estilo surfista preso em um coque. Era loiro, mas os cabelos brancos já começavam a dominar. Vestia bermudão descolado, camisa estampada e tênis – apesar de estar claro que ele preferia mesmo é dirigir descalço. Não era feio, não, e me lembrava, às vezes, o Marcos Mion. Tinha um ar de surfista campeão mundial aposentado que até dava lá seu charme.

Foi Sam quem nos contou toda a história da costa norte. Também nos levou nas principais praias – Waimea é a minha favorita! -, mostrou casas de famosos – não, não dá pra acreditar que na casa do Jack Johnson não tem TV -, contou sobre a cultura de competições de surfe e ainda apresentou a Ron Artis Family Band, um grupo de mais de 11 músicos de uma só família que dão shows em uma casa toda personalizada ao estilo havaiano em Haleiwa.

Brasileiras pareciam ser as favoritas de Sam e depois eu descobri o motivo. Toda vez que ele me via sozinha, observando aquela quantidade louca de informação, o Sam vinha jogar papo fora. Numa dessas conversas, disse que já veio em Santos, no litoral de São Paulo, algumas vezes na década de 90 para competições de surfe e que tinha amado o lugar e as pessoas.

“Vocês têm drogas muito boas”, ele disse, animadão. Fiz uma brincadeira meio “deve ser porque estamos bem próximos da Colômbia” e ganhei o coração do Sam.

O tiozão-instrutor disse que uns surfistas conhecidos dele agora ganhavam a vida trazendo iPhones e câmeras para o Brasil. “Revender dá muito certo. Eles pagam US$ 1500 em 3 ou 4 telefones e saem de lá com quase US$ 6000”, disse, impressionado com a ‘vida boa’ que os amigos levavam.

Antes de irmos embora, o Sam me chamou no canto, me deu seu cartão com telefone e e-mail e disse que ia me ligar quando estivesse no Brasil. “Let’s hang out” foi a última coisa que ouvi dele.

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