33. Verô, a brasileira esposa do turco Nick


Madruguei para pegar a estrada para Massachusetts. Bastante sonolenta, entrei no metrô da 50th st, com a minha mala de mão mais pesada do que eu podia aguentar, fui até a 168th, onde andei 2 ou 3 quarteirões, e parei em frente a uma van branca, daquelas que só dá para ir sentado. O motorista vestia calça jeans escura com lavagem manchada nas laterais, além de uma camiseta azul clara da Rip Curl. Cantava reggaeton com a mesma intensidade que, nos dias de hoje, eu canto ‘Girl on Fire’, da Alicia Keys. Eu amo reggaeton – sempre quis ir a um show do Daddy Yankee – e achava que aquela viagem seria divertida, mas percebi que estava prestes a viver um pesadelo quando ele, que usava óculos estilo robocop, abriu a porta do transporte e anunciou:

‘Temos 13 lugares, mas vamos em 15 pessoas’, disse ele.

Eu sabia que sobraria pra mim. Magro ocupa pouco espaço e pode ir esmagadinho. Deveria ser aquele o castigo por não precisar malhar depois de um pacote de biscoito recheado. Contrariada, mas ainda calma, dividi meu banco com um coreano de uns 19 anos, que parecia desconfiado e assustado… Comigo! Fernando, pai de uma amiga, que já mora lá há um tempo, tentou nos tranquilizar. ‘Só mais 4 horinhas e estaremos lá’, disse. O uso do ‘só’ não caiu bem na situação, tenho que dizer.

A van então deixou Nova York. Nosso destino final era uma cidade chamada Shrewsbury, perto de Boston e Worcester. O lugar tem pouco mais de 35 mil habitantes e é conhecido como… Bom, não é conhecido como nada. A realidade é que ele só está no texto porque é lá que mora a Veronice, a pessoa deste post.

Com seu Chevrolet Tracker, a Verô, como era mais conhecida por ali, nos pegou no ponto final da van, que ficava em frente a um escritório de advocacia em um pequeno centro comercial. Veronice era brasileira, melhor amiga do Fernando e esposa de um cara chamado Nick. Ela era baixinha, tinha o cabelo curtinho e castanho escuro e usava botas de cano médio. Passou o caminho todo citando o marido, o que nos fez perceber o quanto ela o amava e admirava. O Nick era turco, um pouco mais velho e dono de uma loja enorme de 1,99 em Shrewsbury. Assim que chegamos no centro da cidade, conhecemos a loja, que era um mix de papelaria com perfumaria. Simpática, faladeira e falhando no português algumas vezes, a Verô nos puxou pelo braço e nos mostrou as novas pastas escolares que haviam chegado naquela semana. ‘Tomem! Peguem essas para vocês. É presente meu’, disse, ao mesmo tempo que nos preparava um kit com canetas e estojo. Obcecada por papelaria do jeito que eu sou, gostava cada vez mais da Veronice.

Voltamos para o carro e, mais uma vez, pegamos uma estradinha. Seguimos para o bairro onde a Verô morava. No caminho, era impossível não reparar que todas as placas que sinalizavam nomes de ruas tinham um coração enorme desenhado nelas. Eu, pelo menos, sabia que aquela viagem já tinha valido a pena. A inspiração que me deu em Shrewsbury foi algo que eu não sentia há algum tempo.

Dez minutos observando a paisagem e pronto: a Verô estacionou o carro na frente de uma grande casa de madeira bege clara – que mais parecia uma casa de bonecas. Ela entrou, pediu que nos sentíssemos em casa e logo avisou que o almoço seria macarrão com almôndegas. ‘Vocês devem estar cansadas de comer hamburguer, né?’, perguntou, sem esperar resposta. Macarrão é uma das comidas favoritas da minha amiga, a Mariana, mas passava longe de ser a minha. Eu amo mais fast-food do que eu gostaria e, por isso, enquanto a Verô não estava na mesa, disfarcei e passei um pouco do que tinha no meu prato para o prato da Mariana.

Depois do almoço, conhecemos o quarto onde dormiríamos. Com duas camas de solteiro, vários edredons confortáveis e decoração jovem, nos sentimos, de fato, em casa. O banheiro ao lado era numa fofura tão extrema que nos chocou: tapetes coloridinhos, esponjas de peixinhos, toalhas em tons bebê…

– ‘A gente não tem filho, mas fez esse quarto pra quando as sobrinhas do Nick quiserem passar um tempo aqui’, justificou a Verô, que nos viu sorrindo assim que vimos as acomodações.

Jurei que a decoração da casa da brasileira esposa do Nick havia sido feita por algum profissional. Os móveis não eram planejados, mas se encaixavam perfeitamente no espaço. As cores das paredes combinavam e cada artigo dava um toque especial a sala. No quintal enorme, até churrasqueira daquelas grandonas tinha. Não estava totalmente calor, mas a paisagem do lado de fora deixava o casarão ainda mais charmoso, mais estonteante.

Já passava das 4 da tarde quando uma caminhonete branca estacionou na frente da casa. Era o Nick, que tinha lá seus 65 anos. Ele não conseguiu esconder a felicidade quando nos viu. ‘Essas são suas filhas, Fernando? Elas se parecem muito!’, perguntou, com um sotaque carregado fofo. Esclarecemos que não, eu não era filha do Fernando, e ele ficou surpreso. Surpreso daquele tipo que abre a boca grande, fica paradinho no lugar e fica olhando para a cara dos outros sem falar, sabe?

Rindo do estado de choque do marido, a Verô então puxou seu iPhone da bolsa e começou a nos contar das suas várias viagens ao exterior. Ela conhecia praticamente todos os países do Oriente Médio, mas estava ansiosa mesmo era pra mostrar as fotos que tirara na casa de verão de uma amiga no final de semana anterior. ‘Vocês parecem estar em Sex & The City’, eu disse. Ela riu grande, dispersou rapidamente e abriu o vinho branco, que distribuiu apenas para os ‘adultos’. Coisa de pai.

Na cama do quarto de visitas da Verô, tivemos a melhor noite da nossa estadia no exterior. No dia seguinte, só pra nos agradar, ela dirigiu mais de 2 horas para nos levar num grande complexo de cassinos numa cidade próxima. Também nos mostrou a casa de um ex-presidente em Greenwich, onde uma amiga dela trabalhava, e nos deixou no trem garantindo: ‘A viagem de volta para Nova York é linda’. E foi.

3 thoughts on “33. Verô, a brasileira esposa do turco Nick

  1. Minha querida. Que surpresa agradavel sermos uns dos personages de seus artigos.
    We are here, stop by any time.
    Thanks Veronice and Nick
    ( ah! By the way, Nicki ‘s age was 52 kkkkk )

  2. É tão bom encontrar pessoas assim… e o melhor é que você apresenta todas elas de um jeito especial e único em cada texto. Estou amando seu blog.

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