61. Lily Allen, a tal ‘carrasca’ que eu não conheci

Quando o telefone do meu editor tocou na tarde daquele 15 de setembro e o assunto com a assessora da falecida casa de shows Via Funchal era a cantora Lily Allen, eu já sabia: lá vinha bomba. Segundos antes de a ligação acabar, fixei meus olhos na tela do meu computador e comecei, mentalmente, a fazer aquela famosa brincadeirinha. “Batata quente, quente, quente, quente, quente, quente, quente…”, eu repetia. Assim que eu soube que eu entrevistaria a britânica sucesso no mundo todo no dia seguinte, quase gritei um “queimou!” alto.

Na hora que me escalaram para essa pauta, não foi bem medo o que eu senti. Apesar da pouca idade, eu já estava bastante acostumada com coberturas de estrelas internacionais no Brasil. No meu segundo mês de estágio no site da ‘CAPRICHO’, em 2008, me colocaram na cola da banda Simple Plan (certeza que se você lembra!) e da cantora Hilary Duff (essa até merece um post, viu?) e isso fez toda a diferença. Foi aí que eu desencanei desse negócio de nervosismo. Com a Lily Allen, o que eu sentia era um “mas que porra eu estou fazendo da minha vida?” Isso porque o tal “dia seguinte” que tanto falavam era (apenas) a véspera do meu aniversário de 21 anos e eu tenho quase certeza de que queria comemorar a chegada da nova idade de uma maneira diferente. Tentei ver o lado bom das coisas, como sempre faço, afinal, aquela seria mais uma experiência bacana para colocar no meu currículo. Era uma fase ótima de Lily. Depois de estourar no MySpace com ‘Smile’, em 2006, a cantora voltava a brilhar, desta vez com a turnê do álbum ‘It’s Not You, It’s Me’, que saiu no começo de 2009.

No “dia seguinte”, 16 de setembro, lá estava eu, sorridente e feliz voltando do café com a minha calça jeans surrada e meu all star branco, típicos da minha fase de faculdade, quando ouvi pessoas comentando que eu quem entrevistaria a Lily Allen naquela noite. Olhei em volta e os rostos eram todos de “você se fodeu”. Naquele dia, ouvi tanta coisa ruim da cantora que pensei até em forjar uma dor de barriga. “Ela trata todo mundo muito mal”, “dizem que as repórteres saem mal da sala de entrevistas”, “nossa, cuidado para ela não acabar com você”, “viu o que ela anda dizendo no Twitter?” foram só algumas das frases otimistas dos meus companheiros de trabalho. Lembro como se fosse hoje da melancolia no rosto dos outros jornalistas quando desliguei meu computador e dei ‘tchau’ antes de ir para o local do show, onde eu a entrevistaria.

“Boa sorte!”, uma repórter disse, parecendo chateada demais.

O trânsito estava um caos e eu já não tinha mais assunto com o motorista da empresa que me levou para a cobertura. Naquela altura do campeonato, eu só pensava mesmo que eu estava com não só um, mas dois pés atrás. Eu não conseguia acreditar que aquela mulher, famosa no mundo todo, estragaria a minha comemoração de 21 anos.

Entrei pelas costas do Via Funchal por volta das 19h e encontrei com a equipe dela, que me levou até um camarim na casa de shows. Quando cheguei, dei de cara com o Serginho Groismann. Não parecia ter sido seu melhor dia. Ele apressava, por algum motivo, a equipe de vídeo e mal olhava para os lados. Não que isso me incomodasse. Eu nunca fui de tietar ninguém.

Quando chegou a minha vez de falar com Lily, decidi que – fazer o que? – eu tinha que manter a calma. Sorrindo, me apresentei rapidamente. E ela retribuiu o sorriso. Lily era um mix de doçura e timidez naquela noite. Respondeu as perguntas calmamente e riu fofa de algumas brincadeiras típicas de ‘CAPRICHO’. Não, ela não “acabou comigo”, como me alertara a outra repórter. Lily só se mostrou levemente indisposta mesmo na hora de fazer as fotos. Eu entendi, ué. Ela ainda não tinha se maquiado e estava, provavelmente, com a roupa que tinha passado o dia todo. Apesar da ótima direção da fotógrafa na hora do mini-editorial, Lily parecia outra pessoa daquela que tinha acabado de falar comigo. A britânica saiu com cara de antipática em todas as quase 50 fotos feitas. Eu fiquei insatisfeita. Depois de comprovar que ela não era assim, eu precisava de um sorriso. E daí eu não pensei duas vezes:

“At first, when I see you cry-y-y, yeah it makes me smi-i-ile, yeah it makes me smi-i-ile!”, eu comecei a cantar, bem desafinada. Surpresa, Lily me olhou e se segurou para não cair na gargalhada.

A cantoria fez com que Lily saisse sorrindo na foto e eu consegui retrata-la do jeito que eu queria. Mais tarde, durante o show, ouvi ’22’ pensando o que faria se a minha vida fosse igual a da mulher da música. Aos 26, posso dizer que estou tranquila e feliz.

3 thoughts on “61. Lily Allen, a tal ‘carrasca’ que eu não conheci

  1. Tentei do jeito que deu, né, Gabi? Ela definitivamente não foi a pessoa que disse tudo o que eu queria ouvir para ter uma grande matéria para o público adolescente, mas foi educada e sincera de uma forma que eu não esperava.

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