Em meio a movimentada Avenida Lins de Vasconcelos, uma senhora pilota seu carro. Não é lá uma Mercedes, mas tem seu charme. Não corre tanto quanto uma Ferrari, mas na descida, não há quem o segure. É instrumento essencial para o serviço e quando quebra, é necessário passar a noite consertando.
A senhora caminha por ruas e avenidas do Cambuci enquanto olha, atentamente, os quatro cantos do bairro. Não deixa passar nada em branco e tem que correr. Tem que se adiantar para ser a primeira. O mercado é concorrido e se alguém chega antes e leva embora o que vê, já é um déficit altíssimo que se reflete no fim do mês.
Sua vida resume-se em catar papelões, garrafas, ferros e tudo que possa ser reutilizado. É daí que saem seus quase R$ 160 mensais, que são gastos com cuidado, já que o dinheiro de sua aposentadoria e da pensão de seu marido somam pouco menos de R$ 530.
Dona Guilhermina se destaca na multidão de gente ‘rica’ e bonita. É a única “diferente” ali. Não há tinta que consiga rejuvenescer seus cabelos grisalhos e seus 54 anos já começam complicar sua saúde. “Guigui”, como é carinhosamente chamada pelos que a conhecem, sente dores horríveis nas costas toda noite e só acorda se o despertador der uma ajudinha.
Dona Guigui conhece todo mundo. Dá ‘oi’ aqui, diz ‘tchau’ ali. Anda pra lá e pra cá sem se preocupar com os cães que, furiosos, latem e correm em direção a ela.
É negra, baixinha e tem os cabelos crespos que “nem pente penteia”. Seus únicos sete dentes (quatro em cima, três embaixo) dão a ela, por incrível que pareça, uma expressão alegre e tranquila. Guilhermina, porém, não é esse mar de felicidade. Vive na solidão de sua casa desde a morte de seu marido.
Chamava-se Paulo e foi o grande amor de sua vida. Com ele, teve dois filhos “lindos” e “chiques”. O mais velho, de 31 anos, mora no Japão há sete e desde que se mudou, vem poucas vezes visitá-la. A mais nova casou com um jogador de futebol do interior. Vem uma vez por mês, mas nunca tem tempo para ficar. É muito ocupada.
Sabe-se também que Guigui faz serviços de magia. Segundo ela, uma mulher da rua de cima teria sido “amaldiçoada” por seus feitiços. A história é complicada: Sebastião, marido de Vera – a amaldiçoada, saía com Cidinha, que era a melhor amiga de Guilhermina. Cidinha amava Sebastião, que não queria assumi-la para não ter problemas em casa. Mas Guigui não é má senhora, não, viu! Só deu uma ajudinha para a comadre.
Numa dessas noites, Dona Guilhermina, que acabara de jogar conversar fora com uma vizinha, entrou pra casa dizendo que tomaria um café e logo depois lavaria toda a roupa. Passou um dia e nada. Dois e nada.
Agora, Dona Guilhermina só existe mesmo no cemitério da Vila Formosa. A encontraram jogada no chão da cozinha dias desses, cinco dias após a sua morte. Seu rosto já não era o mesmo. Estava completamente deformado. Os insetos e bichos se encarregaram de fazer um servicinho ali. E foi tudo assim, vapt-vupt, igual o correr de seu carrinho nas ruas do Cambuci.
Que triste!
Bj e fk c Deus.
Nana
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tô chorosa </3